Pintando quadros com palavras
Calloni é um artista renascentista. Atua, escreve poesia, e agora nos surpreende com um maravilhoso livro de contos.
Omar Gusmão
Depois de demonstrar, por meio de seu trabalho no teatro e na televisão, que é um excelente ator, Antonio Calloni parece ter decidido provar que seus dotes artísticos vão além dos palcos e telas da vida. Primeiro, o a(u)tor surpreendeu a todos com o livro de poesias "Os infantes de dezembro", sucesso de público e crítica. Reconhecido o poeta de estréia brilhante, o artista agora parece querer mostrar que sua verve literária não se limita aos versos, lançando uma série de 11 contos intitulada "A ilha de sagitário".
E sua nova empreitada já vem arregimentando loas de críticos e literatos. Não é para menos. A prosa de Antonio Calloni é impregnada de poesia. É justamente por sofrer desse mal que os contos do artista são deliciosamente belos. Remetem a imagens que não podem ser descritas de maneira cartesiana ou realista. Assim, o contista consegue descrever o indescritível, como um cheiro de mulher ou oamor de filho para pai.
Segundo a poeta, crítica e jornalista Olga Savary, raros são os escritores que sabem dar o tom preciso falando de seus pais e família como Antonio Calloni. Com "A ilha de sagitário", o autor faz notar que sua paixão pela literatura anda disputando sua preferência com a arte de representar.
O primeiro conto dá nome ao livro. Nele, o autor descreve de maneira bucólica, e por vezes onírica, a experiência de ir caçar com o pai e a cadela Diana. "Estão no mato, um lugar nascido no interior de um tempo rápido, arredio, e todos parecem farejar no silêncio necessário, o quarto caçador. Começaram a caminhar em fila indiana. Seu pai, a cadela e ele. O vento não trabalha, o azul do céu não tem falhas, e o calor apresenta sua pasta gordurosa, ruim. Seus passos de palavras nenhumas contêm milênios".
Em contos como "Sessão da tarde" e "A mulher espumante" erotismo, sexo e relação homem-mulher são tratados pelo autor de maneira não menos poética. O lirismo pungente de "A ilha de Sagitário" revela experiências apreendidas pelo autor. Mais do que contar contos, Antonio Calloni pinta quadros -por vezes figurativos, por vezes abstratos -com as palavras que arruma no papel com o cuidado de um artesão.
publicado no jornal A Crítica
em 18 de janeiro de 2001