Estilo maduro
Antonio Calloni confirma o talento
nos contos de O sorriso de Serapião
Eliane Lobato
O ator Antonio Calloni deixa de ser uma grata surpresa no terreno das letras para assumir a maturidade de seu estilo, de prosa irônica e olhar aguçado sobre o cotidiano. Seu quarto livro, O sorriso de Serapião e outras gargalhadas (Bertrand, 112 págs., R$ 25) confirma a força arrebatadora do autor em contos que transitam entre a vida real e o realismo fantástico, como é o caso do belo Relatório escrito de dentro de uma onda. Nesta condição – de sujeito engolido por uma onda do mar –, alguém anuncia que parou de respirar para continuar a viver. São seres, como diz o próprio autor, que “vivem no limite.”
A história que dá nome ao livro começa com a descrição do personagem-título: “Serapião não era nada, mas era feliz. Trinta anos. Virgem. Cabeça chata e um sorriso furado pela ausência de dois dentes superiores.” Assim Calloni compõe um bravo mané cuja maior honra, e castigo, era amar Amaralina. Ele mistura a crueza do mundo contemporâneo às circunstâncias rudes de um tempo solto no passado. O autor também aceita desafios e resume em uma única página o que é ser uma senha numa sala de espera, no conto O homem objetivo. Consagrado ator de novelas como O clone e Terra nostra (além de teatro e cinema), Calloni sabe como construir personagens, seja interpretando ou escrevendo. Não há lugar-comum em sua narrativa, por mais banal que sejam a situação ou as figuras inventadas. Sobre as duas artes, Calloni resume: “É mais fácil uma pessoa me conhecer através da minha escrita do que do meu trabalho de ator.” O sorriso de Serapião é, sem dúvida, um dos bons lançamentos nacionais deste ano.
publicado em Istoé
em novembro de 2005